domingo, 19 de julho de 2015

Paralisia Cerebral

Alterações no controle motor mandibular e cervical de crianças com paralisia cerebral
Kelly Cristine Schmidt 1 , Marianne Briesemeister 2 , Lilian Gerdi Kittel Ries 3
1 Fundação Catarinense de Educação Especial – FCEE, Florianópolis , SC , Brasil .
2 Universidade do Estado de Santa Catarina , Florianópolis , SC , Brasil .
3 Departamento de Fisioterapia da Universidade do Estado de Santa Catarina , Florianópolis , SC , Brasil .
Objetivo
: analisar a atividade elétrica dos músculos Temporal e Masseter e o padrão de postura e movimento de cabeça e mandíbula de crianças com Paralisia Cerebral (PC).
Métodos
: a amostra deste estudo compreendeu 32 voluntários com PC espástica e com Desenvolvimento Típico, com a faixa etária de 7 a 13 anos de idade, caracterizados com base na Classificação de Angle e Critério de Diagnóstico para Pesquisa das Disfunções Temporomandibulares (RDC/TMD). De forma simultânea, foram avaliadas a postura e movimentação da cabeça e mandíbula e a atividade elétrica dos músculos Temporal e Masseter por meio da cinemática e eletromiografia.
Resultados
: a PC não foi associada a presença de DTM ou com a alteração da oclusão dentária. No grupo PC, foi observada maior assimetria do músculo temporal (p<0.05), maior extensão da cabeça na máxima abertura da boca (p<0.05), maior amplitude de extensão da cabeça (p<0.01) e maior amplitude de projeção anterior da cabeça (p<0.05).
Conclusão
: a maior assimetria na atividade muscular, a maior extensão e projeção anterior da cabeça durante o ciclo mastigatório podem ser causas das desordens da função motora oral das crianças com PC.
Palavras-Chave: Paralisia Cerebral; Músculos Mastigatórios; Eletromiografia
INTRODUÇÃO
Crianças com PC apresentam desordens do desenvolvimento do movimento e postura que causam limitação da atividade. São frequentes as anormalidades do tônus muscular, a fraqueza muscular, os sinergismos musculares limitados, a inaptidão, as contraturas e a biomecânica alterada 1 . Tais distúrbios resultam em um atraso do desenvolvimento neuropsicomotor e podem afetar também o desenvolvimento dos órgãos orofaciais proporcionando um desempenho inadequado de funções como da fala, da sucção, da mastigação, da deglutição e alterações respiratórias 2,3 .
Considera-se que a DTM é desencadeada por processos multifatoriais relacionados à combinação de desequilíbrios entre fatores oclusais, anatômicos, psicológicos, neuromusculares e posturais 4 . Suas principais características são a dor, os ruídos articulares, a função mandibular irregular ou com desvio, que incluem distúrbios relacionados à articulação e ao complexo muscular mastigatório e cervical.
Vários estudos têm sido publicados sobre as consequências da associação dos movimentos mandibulares e cervicais durante a mastigação 5,6 . Acredita-se que durante a mastigação, a influência mútua entre o sistema trigeminal e cervical podem permitir ao sistema trigeminal modular os movimentos cervicais 6 .
Nas crianças com PC as reações de retificação e equilíbrio, necessárias para manter a postura e o controle da cabeça apresentam-se de forma lenta e desordenada, assim como, os reflexos patológicos apresentam-se muitas vezes de forma intensa impedindo este controle cervical e levando a alterações no sistema estomatognático 7 . O desempenho funcional na PC é relacionado ao comprometimento motor e pode haver o envolvimento da musculatura orofacial 8 .
São escassos os estudos que objetivam estudar o controle motor da atividade mastigatória da criança com PC. A maioria dos estudos sobre os transtornos na postura e movimento da criança com PC são relacionados a função motora ampla. Avaliar o equilíbrio dos músculos mastigatórios de crianças com PC pode ajudar no diagnóstico das desordens da função motora oral.
A relevância do tema determina a necessidade de aprofundamento de estudos e investigações sobre o controle motor durante a tarefa de mastigação. A compreensão das alterações da postura e movimento durante a mastigação poderá, numa segunda fase, auxiliar no direcionamento de medidas de intervenção da equipe interdisciplinar. Assim, o objetivo deste estudo é analisar a atividade elétrica dos músculos temporal anterior (TA) e masseter (MA) e o padrão de postura e movimento de cabeça e mandíbula de crianças com desenvolvimento típico (DT) e com PC.
MÉTODOS
Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da instituição (processo n° 26/2009), os pais e responsáveis pela criança, foram solicitados a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido e o termo de consentimento para fotografias, vídeos e gravações, após concordância em participar do estudo, conforme a resolução 196/96 do CNS.
Sujeitos
Trata-se de estudo exploratório de corte transversal. Participaram do estudo trinta e duas (32) crianças voluntárias, entre 07 e 13 anos de idade, divididas em grupo PC (16 crianças) e grupo DT, sem qualquer comprometimento neurológico e/ou musculoesquelético. O grupo PC apresentou 9.94 ± 1.98 anos de idade, com 30.43 ± 10.36 kg de massa e 1.36 ± 0.17 m de altura. O grupo DT apresentou 9.31 ± 1.66 anos de idade, com 33.56 ± 8.28 kg de massa e 1.39 ± 0.14 m de altura. De acordo com o Sistema de Classificação da Função Motora Grossa (GMFCS) 9 , das dezesseis crianças PC do estudo, oito apresentaram acometimento leve (GMFCS nível I e II), três apresentaram acometimento moderado (GMFCS nível III) e cinco crianças apresentaram acometimento motor grave (GMFCS nível IV). Ambos os grupos foram selecionados de forma não probabilística intencional.
Foram excluídos desta pesquisa voluntários com histórico de traumas na face, na ATM, na cervical e/ou na cintura escapular; ausência de dentes; com doenças sistêmicas como artrite, artrose e diabetes; com alterações no sistema vestibular; indivíduos com aparelho dentário e/ou aparelho ortopédico funcional; com uso de medicamentos analgésicos e/ou antiinflamatórios; com uso de toxina botulínica e/ou cirurgias recentes na região avaliada nos últimos seis meses; com incapacidade de compreender ordens simples e de manter a posição sentada.
Procedimento Experimental
As crianças junto com seus acompanhantes foram submetidas a uma anamnese que continha as medidas antropométricas da criança e foram respondidas questões relacionadas aos critérios de inclusão e exclusão deste estudo. Após a troca de roupa por top e shorts, as crianças foram submetidas a uma avaliação clínica, escolhida de forma aleatória; assim como, realizaram avaliação eletromiográfica e cinemática, de forma simultânea.
Avaliação Clínica
Para ambos os grupos a avaliação clínica dos aspectos morfológicos da oclusão dentária baseou-se na classificação de maloclusão de Angle, que com base na inspeção visual da relação ântero-posterior entre mandíbula e maxilar, mediante a posição do primeiro dente molar, que classificou cada sujeito em classe I de Angle (normal), classe II de Angle (retrognatia mandibular) ou classe III de Angle (prognatia mandibular) 10 . Também para ambos os grupos, o diagnóstico de DTM que consistiu em nenhum diagnóstico ou até no máximo cinco diagnósticos para cada sujeito, baseado na história e nos sinais clínicos, foi realizado por meio do Eixo I do RDC/TMD 11 . A amplitude dos movimentos mandibulares foi medida com paquímetro digital de fibra de carbono da marca Western. Devido aos grupos estudados serem compostos por crianças e o questionário auto-aplicável ser desenvolvido para adultos, foram respondidas apenas as questões Q3 e Q14 do mesmo. Ambas respectivamente referentes à presença de dores na face, ouvido e/ou cabeça e história de travamento da mandíbula e relevantes na classificação dos tipos de DTM em relação ao Eixo I do RDC/TMD.
Avaliação Eletromiográfica e Cinemática
Para as análises biomecânicas, a criança permaneceu sentada em uma posição ereta em uma cadeira com um firme encosto torácico, com altura ajustável para fazer suporte no nível escapular. A altura do assento também foi ajustada para 90 graus nos ângulos do joelho, quadril e pés. Durante os exames de EMG e cinemática todos os indivíduos foram orientados a permanecer com braços relaxados, mãos apoiadas sobre as coxas e olhos abertos em direção a um alvo de 5 cm de diâmetro colocado no nível dos olhos, 1,95 cm a sua frente.
No exame eletromiográfico os dados foram obtidos por meio do Eletromiógrafo EMG System do Brasil, Modelo EMG-1200C, com placa conversora analógica/digital de 16 bits de resolução, amplificador de EMG com ganho de amplificação total de 2.000 vezes, filtro passa-banda de 10 a 500 Hz, com frequência de amostragem por canal de 2.000 Hz. A mínima Rejeição de Modo Comum foi de 100 dB. Foram utilizados eletrodos de superfície Medi-trace Kendall-LTP, modelo Chicopee MA 01022. Foram avaliados bilateralmente os músculos TA e MA. A impedância elétrica da pele foi diminuída, limpando-se o local com algodão hidrofílico e álcool 70% para remover células mortas. Antes da colocação dos eletrodos foram realizados testes de função muscular para evitar crosstalk. A localização do eletrodo no músculo TA (verticalmente ao longo da margem anterior dos músculos) e no MA (02 cm acima do ângulo externo do queixo) foi determinada durante a contração em posição de máxima intercuspidação. Todos os eletrodos foram posicionados no ventre muscular, paralelos às fibras musculares com uma distância inter eletrodos de 02 cm 12 . Além disso, um eletrodo de referência foi colocado no manúbrio do osso esterno do voluntário a fim de reduzir a interferência de ruídos elétricos indesejáveis ao sinal eletromiográfico. Após a colocação dos eletrodos foi realizada a coleta para a normalização dos mesmos por meio da Contração Voluntária Máxima (CVM), que foi registrado durante a contração isométrica com apertamento dentário na posição de máxima intercuspidação. Todas as CVM foram sustentadas por cinco segundos e repetidas três vezes cada, com intervalo de um minuto entre cada coleta. Os sinais eletromiográficos foram detectados durante a mastigação não-habitual, onde foi utilizado como anteparo oclusal o material Parafilm M®. Para definir o ritmo foi utilizado um metrônomo com 60 batimentos/min., seguido de estímulo verbal. Cada mastigação não-habitual foi realizada por dez segundos e repetida cinco vezes cada com intervalo de um minuto entre cada coleta.
Para a realização da filmagem bidimensional no plano sagital, a câmera Canon Power Shot A710 IS® operou na frequência de aquisição de imagens de 30 Hz, a 0,85 cm de altura sobre um tripé que estava localizado no lado anteriormente randomizado nas crianças do grupo DT e do lado mais comprometido nas crianças do grupo PC e a uma distância perpendicular de 1,20 m dos voluntários. Para avaliação cinemática foram anexados marcadores esféricos de baixo peso na cor preta incorporados sobre uma base circular de corino na cor branca, aparados com fita adesiva dupla face: na glabela (linha média da face/1 cm acima do nariz), canto do olho, tragus (cartilagem anterior da orelha), na ponta do mento, processo espinhal de C7 13 . Para cálculo das coordenadas reais, um sistema de calibração bidimensional 1.0 x 1.0 foi colocado no plano das filmagens.
Análise dos Dados
Das cinco tentativas de mastigação não-habitual realizadas para cada sujeito, foram analisadas apenas as três primeiras livres de qualquer problema técnico.
A análise cinemática dos movimentos de mandíbula e cabeça ocorreu em o ciclo mastigatório medial, cortado a partir do sinal eletromiográfico por meio de uma rotina que percorre o sinal do EMG já filtrado, utilizando uma janela fixa de tamanho 200ms e procura o menor valor RMS deste sinal. De posse do menor valor RMS e de seu respectivo desvio padrão defini-se o valor de referência para diferenciar o estado de repouso do estado de atividade muscular 14 . O valor de referência utilizado foi igual a 3σ (onde σ é desvio padrão da janela de 200ms do sinal).
Para a digitalização, que foi realizada visualmente, quadro a quadro, o sistema utilizado foi o software Ariel Performance Analysis System (APAS). A sincronização do ciclo entre eletromiógrafo e a câmera de vídeo foi feita por meio de um Flash.
Na análise cinemática, no plano sagital, foi calculado o ângulo relativo à posição da cabeça em relação ao tronco medido por meio do ângulo segmentar entre tragus, C7 e horizontal durante um ciclo mastigatório, onde seu valor decrescente indica uma postura mais anteriorizada da cabeça 13 . A partir deste ângulo foram analisadas as variáveis: 1) Projeção Anterior da Cabeça no Início da Mastigação (PACIM) expressa pelo valor do ângulo no momento de início do ciclo mastigatório; 2) Projeção Anterior da Cabeça na Máxima Abertura da Boca (PACMAB) expressa pelo valor do ângulo no momento de máxima abertura da boca; 3) Amplitude de Projeção Anterior da Cabeça (APAC) calculado pelo valor máximo de extensão da cabeça menos o valor mínimo de extensão da cabeça; 4) Média de Projeção Anterior da Cabeça (MPAC) calculado pela média dos valores angulares de projeção anterior da cabeça.
Foi calculado também o ângulo relativo à posição da parte superior da coluna cervical medido por meio do ângulo segmentar entre canto do olho, tragus e horizontal durante um ciclo mastigatório, onde o aumento de seu valor indica uma postura mais estendida da cabeça 13 . A partir deste ângulo foram analisadas as variáveis: 1) Extensão da Cabeça no Início da Mastigação (ECIM) expresso pelo valor do ângulo no momento de início do ciclo mastigatório; 2) Extensão da Cabeça na Máxima Abertura da Boca (ECMAB) expressa pelo valor do ângulo no momento de máxima abertura da boca; 3) Amplitude de Extensão da Cabeça (AEC) calculada pelo valor máximo de extensão da cabeça menos o valor mínimo de extensão da cabeça; 4) Média de Extensão da Cabeça (MEC) calculada pela média dos valores angulares de extensão da cabeça.
Ainda foi calculada a abertura da boca de um ciclo mastigatório por meio do ângulo articular medido entre glabela, tragus e mento. O objetivo deste ângulo foi analisar as variáveis: 1) Amplitude de Abertura da Boca (AAB) calculada pelo valor máximo de abertura da boca menos o valor mínimo de abertura da boca (Figura 1).
Figura 1 – Ângulos medidos durante o ciclo mastigatório: (A) ângulo entre olho, tragus e horizontal; (B) ângulo entre glabela, tragus e mento; (C) ângulo entre tragus, C7 e horizontal 
Na análise eletromiográfica foram analisadas as variáveis Índice de Simetria da atividade muscular do TA e MA (STA e SMA) e o Coeficiente Ântero-Posterior (CAP) 15 durante um ciclo na mastigação não habitual para cada uma das três tentativas. O índice de simetria da atividade muscular foi calculado por meio da quantificação temporal entre as curvas normalizadas do TA direito e esquerdo e do MA direito e esquerdo com a identificação da área comum entre a atividade bilateral. As áreas EMG do lado direito e esquerdo de cada músculo foram sobrepostas e calculou-se a razão entre as áreas sobrepostas e a área total. O CAP compara a atividade muscular entre os músculos masseteres e os músculos temporais. Neste índice as áreas EMG foram sobrepostas e foi calculada a razão entre as áreas não sobrepostas e as áreas sobrepostas de ambos os lados. A atividade dos músculos analisados está equilibrada, tanto no índice de simetria quanto no CAP, quando o valor obtido for 100%.
Foi realizada a retificação e filtragem dos sinais com uma frequência de corte de 06 Hz para obter o envoltório linear que foi reduzido a 100 pontos (RMS). Este processamento foi realizado por meio do software MATLAB (Versão 5.3 The MathWorks Inc.). Para a normalização, os potenciais EMG das envoltórias lineares foram expressos como o máximo valor de um segundo do RMS obtido por meio das três repetições CVM para cada músculo e sujeito.
Análise Estatística
Os participantes foram caracterizados por meio da estatística descritiva (média, desvio-padrão) e para cada variável foi considerada a média aritmética de três tentativas. A diferença entre a média de idade, massa corporal e altura entre o grupo DT e PC foi analisada por meio do teste t de Students. Para verificar a existência de associação e seu risco entre os grupos DT e PC com a presença de DTM e a presença de alterações na oclusão aplicou-se, respectivamente, o teste Qui-Quadrado e Odds ratio (OR).
Após verificar a normalidade dos dados por meio do teste de Shapiro-Wilk, utilizou-se o Teste T para dados independentes nas variáveis paramétricas e o Teste de Mann-Whitney nas variáveis não-paramétricas. Foi utilizado para análise o programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 17.0 para Windows e, para todos os procedimentos foi adotado o nível de significância de 5% (p<0.05) com distribuição bi-caudal.
RESULTADOS
O teste t determinou que não houve nenhuma diferença das médias de idade, massa corporal e altura entre grupos PC e DT (ρ>0,05). No grupo de crianças com DT, 50% (8/16) não apresentaram nenhum sinal ou sintoma de DTM e 50% (8/16) são portadores de DTM; ainda neste mesmo grupo 56,25% (9/16) apresentam Angle I, 37,50% (6/16) Angle II e 6,25% (1/16) Angle III. No grupo de crianças com PC, 56,25% (9/16) não apresentaram nenhum sinal ou sintoma de DTM e 43,75% (7/16) são portadores de DTM; ainda no grupo com PC 43,75% (7/16) apresentam Angle I, 37,50% (6/16) Angle II e 18,75% (3/16) Angle III. O teste Qui-quadrado mostrou que não existe associação entre os grupos DT e PC com a presença de DTM (p=0,72) e com alterações na oclusão (p=0,48). O rácio de produtos cruzados também mostrou que os grupos DT e PC e presença de DTM/alterações na oclusão são variáveis independentes.
Na Tabela 1 estão representados os resultados encontrados das variáveis eletromiográficas dos grupos DT e PC. Observou-se que o grupo PC apresenta maior assimetria bilateral entre os músculos MA direito e esquerdo, entre os músculos TA direito e esquerdo e um maior desequilíbrio da atividade dos quatro músculos analisados. Contudo, a diferença foi considerada significante apenas para a STA (p<0,05).
Tabela 1 - Média, desvio padrão (DP) e intervalo de confiança das médias (95% ICM) das variáveis eletromiográficas dos grupos com Desenvolvimento Típico (DT) (n=16) e com Paralisia Cerebral (PC) (n=16) 
Média (DP)95% ICMP

DTPCDTPC
SMA a (%)82,80 (7,73)80,39 (9,37)78,67- 86,9275,40 - 85,390,49
STA b (%)85,10 (7,71)81,44 (6,98)80,99 - 89,2177,72 - 85,160,04*
CAP b (%)85,82 (7,15)84,16 (4,94)82,01 - 89,6481,53 - 86,800,62
Na Tabela 2 estão representados os resultados encontrados das variáveis cinemáticas angulares e espaço-temporal de extensão da cabeça dos grupos DT e PC. Crianças com PC apresentaram valores maiores de extensão da cabeça durante a mastigação não-habitual. No entanto, a diferença foi considerada significante apenas para as variáveis amplitude de extensão da cabeça (p<0,01) e extensão da cabeça na máxima abertura da boca (p<0,05).
Tabela 2 - Média, desvio padrão (DP) e intervalo de confiança das médias (95% ICM) das variáveis cinemáticas angulares de extensão da cabeça dos grupos com Desenvolvimento Típico (DT) (n=16) e com Paralisia Cerebral (PC) (n=16) 
Média (DP)95% ICMP

DTPCDTPC
ECIM a (graus)20,10 (6,59)25,97 (14,09)16,59 – 23,6018,46 - 33,470,14
ECMAB a(graus)21,18 (6,36)29,93 (14,87)17,79 - 24,5722,00 – 37,850,04*
AEC b (graus)4,21 (1,43)8,54 (6,58)3,45 – 4,975,04 – 12,050,00**
MEC a (graus)20,65 (6,40)27,24 (14,46)17,24 – 24,0619,54 – 34,950,11
Na Tabela 3 estão representados os resultados encontrados das variáveis cinemáticas angulares e espaço-temporal de projeção anterior da cabeça e de abertura da boca dos grupos DT e PC. Observou-se maior projeção anterior da cabeça para o grupo PC em todas as variáveis analisadas. Para as variáveis angulares de Projeção Anterior da Cabeça no Início da Mastigação, Projeção Anterior da Cabeça na Máxima Abertura da Boca e Média de Projeção Anterior da Cabeça, quanto menor o valor da média angular maior será a projeção anterior da cabeça. No entanto, para variável espaço-temporal de Amplitude de Projeção da Cabeça, única que se mostrou estatisticamente significante (p<0,05), quanto maior o valor do deslocamento da cabeça, durante um ciclo mastigatório não habitual, maior será a projeção anterior da mesma. Também se observou, para o grupo PC, uma maior abertura da boca durante um ciclo mastigatório não habitual, contudo, este resultado não foi estatisticamente significante.
Tabela 3 - Média, desvio padrão (DP) e intervalo de confiança das médias (95% ICM) das variáveis cinemáticas angulares de projeção anterior da cabeça e abertura da boca dos grupos com Desenvolvimento Típico (DT) (n=16) e com Paralisia Cerebral (PC) (n=16) 
Média (DP)95% ICMP

DTPCDTPC
PACIM (graus)44,92 (7,55)41,00 (9,26)40,90 - 48,9436,07 - 45,940,09
PACMAB (graus)45,14 (7,75)41,41 (9,14)41,01 - 49,2736,54 - 46,280,05
APAC (graus)1,89 (0,82)3,54 (2,35)1,45 - 2,332,29 - 4,790,01*
MPAC (graus)44,99 (7,68)41,78 (9,16)40,90 - 49,0936,90 - 46,660,09
AAB (graus)9,73 (3,80)12,80 (6,59)7,71 - 11,769,28 - 16,310,11
DISCUSSÃO
Entre as alterações comumente encontradas no exame neurológico dos indivíduos com PC estão as assimetrias de postura, de tônus e/ou de habilidades funcionais 16 . Esta assimetria também foi encontrada durante a tarefa de mastigação. Para ambos os músculos, TA e MA, a assimetria da atividade elétrica durante uma contração isotônica se mostrou maior no grupo PC. Contudo, observou-se diferença significante apenas para o músculo TA. Corroborando estes resultados, Ries and Bérzin (2009) observaram maior assimetria na atividade dos músculos MA e TA durante a função mastigatória, tanto durante a contração isométrica quanto na contração isotônica 8 . As desordens do tônus, da postura e do movimento da criança com PC também influenciam a atividade muscular envolvida na mastigação.
De uma forma geral, o movimento mandibular durante a mastigação pode parecer simples, mas uma observação cuidadosa expõe características assimétricas e grandes variações de ciclo para ciclo 17 . Há autores que admitem como normal um índice de simetria para adultos saudáveis de no mínimo 82 ± 1,34% 18 e outros determinaram parâmetros normais de simetria para o músculo Masseter de 87,11 ± 1,60% e para o músculo TA de 88,11 ± 1,45% 19 . Assim sendo, certo grau de atividade assimétrica deve ser considerado na maioria dos indivíduos, visto que o crânio raramente é simétrico e o sistema muscular ao tentar compensar este desequilíbrio esquelético gera forças também assimétricas 20 .
Se forem considerados os parâmetros normais de simetria de Felicio, Sidequersky, Tartaglia, and Sforza (2009)19 , os dois grupos poderiam estar dentro da normalidade. Já os parâmetros de Ferrario, Sforza, Miani Jr, D’Addona, and Barbini (1993) 18 mostram que a simetria, tanto do músculo TA (81,44 %) quanto do músculo MA (80,39 %) do grupo PC, está fora da normalidade. A característica assimétrica exacerbada da atividade destes músculos nas crianças com PC pode prejudicar o desempenho da tarefa de mastigação.
O músculo TA possui a função de elevação e retração da mandíbula durante a mastigação e ao contrário do músculo MA está mais relacionado ao movimento mandibular do que à força mastigatória 21 . Além disso, responde pelo equilíbrio e controle postural da mandíbula. Desta forma, o maior desequilíbrio na atividade do músculo TA nas crianças com PC, poderia ocorrer devido às alterações de tônus, postura e movimentos nesta patologia, alterando o equilíbrio e o controle postural da mandíbula.
A limitação nos sinergismos musculares nas crianças com PC é considerada uma das causas de incapacidade e limitação funcional das mesmas 1 . No entanto, essa limitação não foi observada no equilíbrio da atividade EMG dos quatro músculos analisados. Os grupos PC e DT apresentaram valores do CAP semelhantes.
O tônus anormal encontrado em crianças com PC pode resultar em padrões anormais de postura e de movimento, como por exemplo, atraso e diminuição no controle da cabeça 22 . O início da movimentação em extensão da cabeça em geral precede o início de movimento de abertura da mandíbula, o que indica um ajuste antecipatório da posição da cabeça preparatório para o movimento mandibular 5 . Os músculos da mandíbula e do pescoço apresentam movimentos associados e alterações em uma das estruturas podem desorganizar a outra.
A extensão da cabeça na máxima abertura da boca, a amplitude de extensão da cabeça e a amplitude de projeção anterior da cabeça no grupo PC foram significantemente maiores em relação ao grupo DT. Estas alterações na projeção anterior e extensão da cabeça poderiam ser explicadas pelo menor controle de postura e movimento da cabeça e pela presença de um padrão extensor presente nas crianças com PC espástica. A hiperextensão da cabeça nestas crianças prejudica a elevação da laringe resultando em aspiração do alimento, da mesma forma, pode levar a protrusão ou retração da língua e a uma movimentação inadequada da mandíbula 23 . Da mesma forma, a extensão correta da cabeça obtém vantagens biomecânicas que favorecem a coordenação entre mandíbula e cabeça e aprimora a produção de forças durante a mordida 5 .
Embora se tenha encontrado maior projeção anterior e extensão da cabeça em crianças com PC, a diferença na amplitude de abertura da boca entre os grupos não foi significante. Corroborando estes resultados, Ries and Bérzin (2005) 12 também não encontraram diferença significante na máxima abertura da boca em crianças com PC e DT, sendo que a mesma se apresentou de forma semelhante e dentro da normalidade para os dois grupos.
Essas alterações de postura da cabeça encontradas nas crianças com PC poderiam ser fatores etiológicos de DTM, por influenciarem na posição de repouso mandibular e causar disfunção dos músculos mastigatórios. No entanto, alterações posturais da cabeça não são necessariamente mais frequentes em sujeitos com DTM 4 . Também existem relatos que a característica assimétrica da atividade elétrica dos músculos mastigatórios apresenta-se maior nos indivíduos com DTM 24,25 sendo que esta atividade anormal pode ser influenciada por alterações oclusais 15 . Foi considerado que crianças com PC apresentam maior incidência de alterações oclusais devido a anormalidades na musculatura oromotora, com maior proporção de Classe II de Angle e menor de Classe III de Angle 10 . Apesar de no presente estudo as crianças com PC apresentarem maior assimetria dos músculos MA e TA e maiores alterações na movimentação da cabeça durante o movimento mandibular, estas alterações não parecem ter aumentado o risco de DTM e alterações oclusais. A DTM e as alterações oclusais não foram associadas à presença de PC.
Os movimentos funcionais da mandíbula são o resultado da ativação coordenada dos músculos da mandíbula e da cervical, permitindo movimentos simultâneos entre as articulações temporomandibulares, atlanto-occipital e coluna cervical 5 . Os resultados do presente estudo mostram que as limitações motoras e funcionais das crianças com PC estão associadas com anormalidades no controle dos movimentos da mandíbula e da cabeça durante a tarefa da mastigação. Considera-se importante avaliar os movimentos cervicais durante a avaliação das desordens orofaciais miofuncionais da criança com PC. O desenvolvimento adequado da função mastigatória proporcionaria equilíbrio muscular prevenindo distúrbios no complexo craniofacial.
CONCLUSÃO
A maior assimetria na atividade muscular durante o ciclo mastigatório, com maior alteração na extensão e projeção anterior da cabeça mostra a maior dificuldade no controle dos movimentos da mandíbula e da cabeça das crianças com PC. Estas alterações do controle motor mandibular e cervical podem ser causas das desordens da função motora oral da criança com PC. A PC não foi associada a presença de DTM ou com a alteração da oclusão dentária, apesar deste grupo apresentar comprometimento motor e maior alteração no controle dos movimentos mandibulares e da cabeça durante a atividade mastigatória.
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Recebido: 28 de Maio de 2012; Aceito: 05 de Setembro de 2012

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